Fechar
O que você procura?
Paraíba
Foto: ParaibaOnline
Continua depois da publicidade
Continue lendo
Nunca fui muito social. Raramente interajo com as pessoas além dos cumprimentos habituais, isso porque vivo em constante estado de observação do mundo em minha volta. Sou mais um observador do que um ser sociável, uma vez que as palavras são políticas, mas os atos e gestos involuntários dizem muito. Quando estou em um evento público, por exemplo, analiso, examino, reflito, capto as energias e muitas vezes me distancio, a pretexto de tirar fotos ou fumar um cigarro, para enxergar o ambiente em sua totalidade sob nova perspectiva de análise social. Como explica José Saramago: “É necessário sair da ilha para ver a ilha”. E esse comportamento estendo para a observação geral, seja no campo ou da cidade, examino vegetações, pássaros, edificações, fluxos de gente e as mais diversas situações do mundo físico e social. Não que eu seja melhor do que ninguém, acho que essa é uma característica de todo expatriado, observar para compreender e se adaptar ao exílio.
Quando cheguei para morar em Campina Grande, nos anos 80, foi um choque cultural pra mim. Percebi que tudo aqui é diferente, Campina é única (no vocabulário, sotaque, costumes, trejeitos, cultura e vida social), e uma coisa em especial que me chamou a atenção foi o bairrismo que havia aqui em relação à capital do Estado, bem visível no orgulho e na defesa exacerbada do povo campinense às alegadas virtudes da chamada Cidade Rainha em comparação a João Pessoa.
Mas um inconveniente constante nessas comparações era o fato de João Pessoa possuir o Viaduto Damásio Franca, construído em 1970 como um marco da modernização no Centro pessoense, enquanto Campina não tinha viaduto. Sempre se debatia na Câmara dos Vereadores se erguer um viaduto na cidade, não por necessidade, mais por capricho, e lembro que em 1999, quando o prefeito Cássio Cunha Lima estava em campanha para a venda da Companhia Energética da Borborema – Celb (hoje Energisa), foi feita uma pesquisa de opinião para determinar-se as obras que poderiam ser realizadas com o dinheiro da venda da estatal e a construção de um viaduto, seja lá onde fosse, foi a opção mais votada.
Três anos depois, Cássio se elegeu Governador da Paraíba e, em fevereiro de 2006, iniciou a edificação do prometido viaduto de Campina Grande. O local escolhido foi sobre o giradouro Dr. Francisco Wanderley, interligando a Av. Manoel Tavares à Floriano Peixoto e à Avenida Canal, uma obra faraônica que consumiu mais de três mil metros cúbicos de concreto estrutural, mais de quinhentos mil quilos de aço e mais de mil toneladas de concreto betuminoso. O viaduto foi feito com absurdos 147 metros de vão livre suspensos com cabos (estais) tensionados em forma de leque ligados a um pilar central quadrangular e alongado de 60 metros de altura, a composição ficou uma belíssima e ousada peça arquitetônica que até lembra a elegante ponte do Rio Pinheiros, em São Paulo.
A inauguração desse suntuoso monumento viário urbano, uma demanda histórica de Campina Grande, que levou o nome do ex-prefeito Elpídio de Almeida, ocorreu em 03 de outubro de 2007, antecipando as comemorações dos 147 anos do aniversário da cidade, evento realizado com muita festa e palco armado para o show da banda Chiclete com Banana.
Na época, eu não andava por aquelas bandas ou me interessava em acompanhar os acontecidos da cidade, por isso nem lembro de ter visto a construção do viaduto. Mas, um dia desses, caminhando ali perto, pude vislumbrar com atenção e análise o Viaduto Elpídio de Almeida em toda sua beleza e complexidade e até o comparei a um molusco gigante, com seus tentáculos a erguer a ponte viária. Apressei o passo porque começou a chover e fui me amparar embaixo do viaduto. Pensei que seria uma chuva passageira, mas demorou a estiar. Observador que sou, e com tempo, comecei a examinar suas estruturas e notei que na parte não contemplada pelos cabos havia duas colunas sustentando a ponte no chão, com distância de 20 metros de uma para outra, então calculei mentalmente as distâncias e notei que seria perfeitamente viável o viaduto não ter sido feito suspenso em cabos de aço, bastava erguer mais seis colunas ao longo da ponte e a mesma ficaria toda apoiada em terra. Posso estar enganado, não sou engenheiro e sei reconhecer os limites de meu saber, mas se as partes do viaduto fora da área suspensa por estais se apoiou em colunas e havia possibilidade de outras colunas serem erguidas sem afetar a pista do giradouro, é factível que o viaduto poderia ter sido erguido ali com o tabuleiro da ponte todo apoiado em colunas, sem precisar do pilar central e os vinte cabos tensionados que sustentam a ponte.
Vale frisar que o viaduto estaiado não encareceu demasiadamente a obra, uma vez que o valor da torre e dos cabos seria substituído pelo do acréscimo de mais seis colunas de concreto, caso se quisesse fazer um viaduto comum, e conclui-se, portanto, que todo esse aparato de estaias foi um engenho proposital, onde o confrade Cássio Cunha Lima optou por dar mais beleza e monumentalidade ao viaduto, ciente de que o mesmo foi erguido para ser um monumento ao competitivismo e alusivo à exaltação do povo campinense à cidade Rainha da Borborema. Não bastava ser um viaduto, tinha de ser “o viaduto”.
© 2003 - 2025 - ParaibaOnline - Rainha Publicidade e Propaganda Ltda - Todos os direitos reservados.