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Foto: Ascom/Vaticano
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A morte do papa Francisco, 88, por AVC (Acidente Vascular Cerebral) e insuficiência cardíaca na manhã desta segunda-feira (21) pode ter sido acelerada pelos problemas de saúde anteriores, na avaliação de geriatras ouvidos pela reportagem.
Dados da literatura médica apontam, por exemplo, que o risco de AVC isquêmico aumenta de três a oito vezes após infecções respiratórias como pneumonia, gripe ou Covid. Outros indicam que até 20% dos idosos hospitalizados podem ter quadros de insuficiência cardíaca grave após internações por pneumonia ou gripe.
De acordo com o atestado de óbito assinado pelo médico do Vaticano Andrea Arcangeli, o papa entrou em coma e teve um colapso cardiorrespiratório irreversível às 7h35 no horário local (2h35 do horário de Brasília). Francisco tinha histórico de insuficiência respiratória aguda, causada por pneumonia bilateral, múltiplas bronquiectasias (dilatação dos brônquios), hipertensão e diabetes tipo 2.
Foi a pneumonia que o levou a ser hospitalizado em 14 de fevereiro. Durante a internação, o papa sofreu diversas crises respiratórias. Uma semana depois, ele teve crise asmática prolongada e também recebeu transfusão de sangue devido a uma trombocitopenia (diminuição das plaquetas) associada a uma anemia.
Em março, Francisco sofreu dois episódios de insuficiência respiratória aguda, causados por um acúmulo de líquido no pulmão, seguido por broncoespasmos. Em anos anteriores, Francisco também havia sido submetido a cirurgias no abdômen e no cólon. Também passou a usar muletas, depois cadeira de rodas, devido a dores nos joelhos e à perda de força nas pernas.
Segundo o geriatra Eduardo Ferriolli, professor titular de geriatria da USP e uma das referências internacionais sobre síndrome da fragilidade do idoso, o papa Francisco preenchia os critérios para essa condição que, resumidamente, pode ser traduzida como a ausência de reservas fisiológicas.
Ferriolli afirma que, diante do quadro de fragilidade em que o papa já se encontrava, uma nova infecção ou um evento agudo, como um AVC, tem o potencial de provocar rapidamente a morte de uma pessoa. “É como um dominó. Se cai uma peça, as outras todas vão caindo em seguida.”
O médico geriatra e paliativista, Douglas Crispim, diretor do corpo clínico da unidade Perdizes do Hospital das Clínicas de São Paulo, tem a mesma opinião. “Uma pessoa com fragilidade tem uma resposta fisiológica inferior a esses eventos catastróficos [como o AVC], uma reserva menor para passar por eles, e um risco de morte aumentado.”
De acordo com ele, repetidas infecções respiratórias em um curto intervalo de tempo, por exemplo, já são consideradas hoje marcadores de mortalidade em idosos.
“O principal marcador prognóstico, ou seja, se você vai morrer ou não, é o número de infecções repetidas, com um tempo livre de infecção mais curto. Quando o papa começou a fazer poli-infecções, chamou-nos a atenção de que ele poderia estar chegando na fase final da vida.”
A médica Maísa Kairalla, geriatra do Hospital Sírio-Libanês, explica que dados da literatura médica e da prática clínica mostram que infecções respiratórias causam uma grande piora funcional em idosos já fragilizados. “Você dificilmente reestabelece o status prévio.”
Por isso, ela afirma que é muito importante que as pessoas não subestimem uma gripe, uma pneumonia ou qualquer outra infecção respiratória em idosos. “Aquilo que você vê no dia a dia, a tosse, a coriza, é só a ponta do iceberg. Esse quadro descompensa as doenças crônicas de base.”
Kairalla diz que, provavelmente, o papa também deve ter usado muito corticoide no tratamento das bronquite e da pneumonia, e a medicação que leva a uma piora da imunidade geral.
Na opinião de Eduardo Ferriolli, Francisco já demonstrava nos últimos meses uma extrema fragilidade. “Nessa situação, qualquer desequilíbrio pode ser uma cascata de eventos que levam a pessoa à morte. Ele já estava em um momento em que a vida estava por um fio o tempo todo.”
Para ele, o pontífice sabia disso. “Ele deu um exemplo maravilhoso de dedicação, de valor à vida. O tempo que tinha, ele serviu. Foi um líder brilhante até os últimos dias.”
Na avaliação de Douglas Crispim, a morte do papa Francisco é um grande exemplo de morte paliativa. “A equipe médica não era a favor de que ele fizesse essas aparições pública, tivesse contato direto com as pessoas, mas ele queria trabalhar e foi respeitada a dignidade dele. Para um indivíduo estar ativo na véspera da morte, certamente também foi feito um bom controle dos sintomas das doenças de base.”
*CLÁUDIA COLLUCCI/ Folhapress
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