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Jornalista, professor universitário, escritor e membro da Academia de Letras de Campina Grande.
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Nos últimos dias a gente vem acompanhando uma espécie de viral nas redes sociais onde os usuários estão utilizando o ChatGPT para transformar fotografias em desenhos inspirados no estúdio Ghibi. Pela particularidade dos traços, a riqueza de detalhes, logo os internautas ficaram impressionados com suas representações em formatos de desenhos coloridos e cenários fantásticos. Coincidentemente eu estava terminando de assistir alguns dos filmes desse estúdio japonês cofundado por Hayao Miazaki. São filmes bonitos esteticamente, mas também com referências humanas e fantásticas. Eu assisti, nos últimos dias, três desses filmes: A Viagem de Chihiro, O Menino e a Garça e Túmulo dos Vagalumes. São filmes de uma beleza brutal. O estúdio Ghibli é premiado no mundo todo, vencedor de Oscar e com histórias que tocam, que emocionam, que nos fazem refletir.
Eu já havia pensado em escrever sobre esses filmes, sobre esse diretor, sobre essa técnica de produção que se utiliza muito dos animes. E essa repercussão todas nas redes só reforçou a necessidade de debater esse tema. O estúdo Ghibli é fantástico. O Menino e a Garça é um filme que fala sobre uma relação de amizade entre um pássaro e uma criança que perdeu a mãe durante um incêndio e que está à procura dela, porque ele acredita que a mãe ainda estaria viva em algum lugar. Daí ele se transporta para o universo fantástico. Em A Viagem de Chihiro acontece algo parecido, uma menina sai com seus pais e acaba entrando numa viela que a transporta para um outro universo. Seus pais são transformados em porcos e essa menina vai descobrindo coisas, lutado com as mudanças, as transições, as descobertas já que ela está passando de uma fase que é a infância para a juventude.
A obra desse diretor possui uma relação muito próxima com os horrores da Segunda Grande Guerra. Trata-se de um estúdio japonês. Então, em praticamente todos os filmes, ele faz essa referência a bombas caindo sobre as cidades japonesas. O próprio Miazaki vivenciou um pouco essa questão. Seu pai teria lucrado com a Guerra comercializando aviões. Mas um dos filmes mais fortes, brutais, emocionantes e comoventes do estúdio Ghibli trata-se de Túmulo dos Vagalumes. Por mais que seja uma animação, por mais que seja um desenho, esse filme nos comove de forma muito forte porque nos leva a refletir sobre a vida no momento de muita privação. O enredo é sobre duas crianças órfãs que passam a sobreviver sozinhos e a encontrar forças no momento de extrema necessidade. O que o diretor nos mostra é que mesmo nessas situações tão difíceis em que essas crianças se encontram, elas não perdem a alegria de viver. Passam fome, sede, frio, não têm onde ficar, adoecem, mas elas estão sempre felizes e buscando razões para continuar vivendo. Os personagens centrais, que são um adolescente e a sua irmã, uma menina muito jovem, andam pelo mundo criando estratégias para sobreviverem àquele momento difícil em que eles se encontravam.
Uma das cenas mais bonitas e chocantes desse filme é quando eles coletam vagalumes para iluminarem o ambiente onde eles se encontram. Especialmente para a gente que é de sítio, nós que temos uma relação muito próxima com a natureza, aquilo torna-se em algo poético. Eu fiquei feliz porque as pessoas estão tendo conhecimento desse estúdio, desses conteúdos, e espero também que essas mesmas pessoas possam acessar esses materiais, assistir a esses filmes e se comoverem, assim como eu me comovi, me emocionei… Uma característica desse diretor é que em seus trabalhos há sempre uma viagem ao mundo fantástico, mas com uma forte conexão com a realidade.
Nas redes sociais, o debate se estendeu entre aqueles que aprovaram e os que desaprovaram o uso da inteligência artificial para criar imagens inspiradas nos animes do estúdio Ghibli. Até uma entrevista de Hayao Miazaki, publicada há quase dez anos, foi resgatada para reforçar a ideia de que ele não estava nem um pouco satisfeito com esse uso de suas referências artísticas pela IA. Para alguns internautas trata-se de uma homenagem ao criador de A Viagem de Chihiro. Para outros é uma violação dos direitos de autor. Contudo, parece que não se tem um comentário atual sobre o cofundador dos estúdios Ghibli sobre a febre de reprodução de seus desenhos nas redes. O fato é que todo o processo criativo de Miazaki é feito de forma manual, artesanal. Ele sempre se negou a usar os recursos de computador para criar personagens e cenas de seus filmes. Tudo é construído a mão, um por um, cena por cena, o que leva anos e anos.
Quando estava no processo de entrevistas para a biografia do artista plástico polonês Maciej Antoni Babinski, eu conversei com o filho dele, Daniel Babinski, sobre um documentário que ele produziu com o pai. A capa desse vídeo é uma espécie de quadro de Babinski, um autorretrato atual, com o artista plástico já envelhecido. Daí eu perguntei: Daniel, você fez isso com inteligência artificial? Ele respondeu: sim, Jurani. É uma coisa impressionante. Inseri uma imagem recente do meu pai, também anexei no computador uma tela dele para que a máquina retirasse o traço do artista e quando a IA apresentou o resultado eu fiquei surpreso. Ficou muito igual a forma como ele pinta. Eu até levei essa foto e mostrei para ele. Sabe o que ele me disse? Respondi que não sabia, mas imaginava que ele teria ficado surpreso. Foi então que Daniel falou: ele olhou assim, deu uma risada e disse: tá vendo! Eu não preciso mais pintar. Risos.
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