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Existe um nicho no TikTok muito bem engajado: o de mães grávidas na adolescência.
A hashtag gravidez na adolescência soma mais de 40 mil vídeos em que meninas mostram o seu dia a dia em uma nova fase da vida, enquanto geram uma criança ou assim que dão à luz.
Os vídeos de dancinha populares na plataforma dão lugar a conteúdos de “arrume-se comigo para levar a bebê na primeira consulta” ou “arrumando a mala para o dia do parto”.
O tamanho do vídeo passa a ser de um minuto para serem monetizados no TikTok, ou seja, gerarem dinheiro.
Há cinco meses, Larissa Pereira, 19, entrou para esse grupo. Ela posta vídeos mostrando sua rotina cuidando do filho de dois meses, Ravi Lucca, para os seus 126 mil seguidores do TikTok —que começa a pagar por conteúdos a partir dos 10 mil seguidores. Todo vídeo é acompanhado pela frase “mãe aos 19”.
Larissa sempre gostou da internet. Ela fazia vídeos para o YouTube –hoje já deletados— e voltou a falar com as câmeras após o incentivo de uma amiga, que mostrou a ela os vídeos de rotina de Nicole Lopes.
Todos têm um formato parecido, com narração e algumas imagens de tarefas de casa. Nicole também foi mãe aos 19 e posta vídeos que chegam a mais de um milhão de visualizações.
A ideia de Larissa envolvia ganhar dinheiro para poder pagar o aluguel e morar com o pai do seu filho.
Ela conseguiu. Um de seus vídeos, por exemplo, se arrumando para o seu chá de bebê, conta com mais de 5 milhões de visualizações.
Virou uma comunidade em que uma se inspira na outra para fazer esse tipo de vídeo de rotina.
“Ao se expor, elas buscam as pessoas que estão passando pelo mesmo, buscam apoiar”, diz Fernanda Monteiro, médica com experiência em medicina de família e comunidade e diretora técnica de clínica médica na ViBe Saúde. “Quando a gente se encontra com essas pessoas, é como uma terapia de grupo.”
A médica ressalta que, nesse período, a gestante adolescente se isola quando a barriga cresce, deixa de frequentar a escola e sente medo dos julgamentos ao redor, de vizinhos, familiares e amigos. Além disso, diante de tantas mudanças, a inesperada chegada de um bebê pode abalar a vida de uma adolescente mais do que a de uma mulher adulta.
Os comentários nas redes são diversos, tanto negativos quanto de apoio. A frase “não apoie gravidez na adolescência, mas apoie uma mãe adolescente” é comumente usada por usuários nas redes para ajudarem de alguma forma a menina que faz o conteúdo.
Larissa afirma que recebe muitos elogios e que se foi acolhida. “Eu amo minhas seguidoras”, diz. Ainda assim, não nega que há muitos comentários que a desagradam.
“O problema da rede social é justamente que, por outro lado, a gente está se expondo e o julgamento vem, a crítica dos falsos moralistas”, afirma Monteiro.
Para Karla Cerávolo, diretora da Rede Umbiguinho de psicólogas obstétricas, é importante a adolescente ter um filtro e acompanhamento ao utilizar as redes sociais dessa forma.
“Quando atendemos a gestantes adolescentes e elas querem se expor, a gente promove essa orientação para que ela faça isso de forma saudável e entenda que nem tudo que ela vai ouvir e ler ali será positivo”, diz. “Com certeza ela vai sofrer essa retaliação”.
Mas há também o receio, por parte do público, de uma certa romantização da gravidez na adolescência. Larissa afirma que recebe comentários de suas seguidoras dizendo que a meta de vida delas é ter a sua vida e que queriam muito ter um filho. “Eu falo: ‘não. Não faz isso, pensa em você, pensa no seu futuro, vai fazer um curso, vai estudar porque não é a hora.”
Para Larissa não era a hora, mas ela diz que aprendeu a lidar com a gestação. “De primeira eu não aceitei”, diz. “Eu queria outras coisas para o meu futuro, não isso. Porém, com o tempo fui aceitando.” Nesse processo, ela conta que discutiu com a mãe, mas hoje já se reconciliaram.
“Tem dias que eu não tô muito bem comigo e não consigo postar vídeo. Isso é ruim porque, querendo ou não, eu ganho por isso.” Ela afirma que tem sido difícil conciliar o puerpério com as gravações, os cuidados com seu filho recém-nascido e as tarefas de casa, ainda que conte com a ajuda da mãe, da sogra e do marido.
Cerávolo afirma que diante de tantas demandas, a mãe irá se cobrar para produzir conteúdo, para estar bonita, mostrar a barriga, mostrar que o bebê está bem, que está amamentando, enfim. “Todas as nossas puérperas deveriam ter o cuidado com essa exposição nas redes sociais. Um bebê que chega precisa dessa extragestação. Precisa que essa mãe esteja voltada a ele”, diz.
*VITÓRIA MACEDO/folhapress
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