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Pessoas com processamento visual mais lento (por perda gradativa) têm risco elevado de desenvolver precocemente demência, mostra um novo estudo publicado na revista científica Scientific Reports. Os pesquisadores defendem que os exames de sensibilidade da vista podem ser usados na detecção de pacientes suscetíveis a essa e outras condições neurodegenerativas, como Alzheimer.
Entretanto, segundo Jamerson de Carvalho, coordenador do ambulatório da memória do hospital da UFPB (Universidade Federal da Paraíba), a busca por pacientes com probabilidade de desenvolver demências é um paradoxo da medicina, já que não existe tratamento curativo para ela e a informação pode se tornar um fardo na vida da pessoa. Há, entretanto, uma corrente minoritária que defende que a detecção precoce possibilita prevenir complicações e melhorar o planejamento de futuro.
As demências são um conjunto de doenças típicas da velhice e caracterizadas pela perda de cognição e outras funções cerebrais. As mais conhecidas são o Alzheimer e o Parkinson. O diagnóstico delas depende de uma série complexa de itens.
Além do histórico clínico detalhado, com o tempo de ocorrência, ordem de aparecimento e caracterização de cada sintoma, também é preciso realizar testes com um neurologista para avaliar as funções cognitivas, como memória, linguagem ou funções executivas, diz Carvalho.
O estudo publicado neste mês, no entanto, aponta que perdas de sensibilidade visual precoce podem ser utilizadas para identificar pessoas com tendência maior a sofrer com perda cognitiva. Para chegar a essa conclusão, os especialistas analisaram os dados de 9.000 participantes no Reino Unido. A capacidade de processamento da visão dos pacientes foi avaliada através de um teste de sensibilidade visual (TSV).
Esse exame avalia tanto a velocidade básica de processamento da visão quanto outras habilidades mais complexas, como contraste visual e capacidade de percepção espacial de objetos específicos entre outros em movimento —o tipo de habilidade que usamos ao olhar placas de trânsito enquanto dirigimos, por exemplo. Nas análises de dados, o TSV foi comparado com duas ferramentas padrão-ouro de triagem de pacientes com demência, conhecidas por HVLT e o SF-EMSE.
Após 15 anos, os participantes foram avaliados novamente. No período, cerca de 500 tiveram algum diagnóstico de demência. Os pesquisadores viram que, de forma geral, quem sofreu perda cognitiva já apresentava, 15 anos atrás, uma capacidade visual comprometida.
Os resultados da pesquisa podem ajudar médicos e pacientes na identificação dos riscos futuros para doenças como o Alzheimer. O uso combinado dos testes TSV com outras avaliações é mais assertivo, segundo eles, e possui maior sensibilidade que outros exames de rastreio mais utilizados.
Apesar de reconhecer a robustez do estudo, Carvalho, da UFPB, faz ressalvas quanto à baixa sensibilidade e especificidade do teste. Problemas visuais são típicos do próprio envelhecimento e existem várias desordens que podem afetar o olho, como catarata, glaucoma, diabetes e hipertensão, que constituem fatores de confusão. “Como preditor de demência não sustenta”, afirma o especialista.
Estudos anteriores já apontavam a existência de uma relação entre a perda de visão e a demência. Um artigo publicado em 2023 no Journal of American Medical Association Ophtalmology com 3.000 participantes avaliou a acuidade visual de distância e proximidade e a sensibilidade dos voluntários ao contraste, e concluiu que quanto menor a habilidade de pessoas mais velhas para enxergar, maior o risco de neurodegeneração.
Não só a perda visual está relacionada com a ocorrência de demência, mas qualquer perda sensorial, como a auditiva. Ainda não estão completamente claras as razões para essa relação. Está bem estabelecido, entretanto, que as perdas olfativas estão mais ligadas a essas doenças, especialmente do Parkinson, e podem ser marcadores de casos mais severos, enquanto os déficits na visão e audição indicam apenas uma vulnerabilidade maior da pessoa.
Um outro estudo, também de 2023, acompanhou os dados de saúde de um conjunto de participantes na Coreia do Sul por sete anos. No total, foram identificados mais de 8.000 casos de demência. Os resultados mostram uma correlação entre a doença e a perda de sensibilidade auditiva ou visual.
Ivan Okamoto, neurologista do Hospital Israelita Albert Einstein, diz que, embora existam correlações, as perdas sensoriais não são a principal marca das demências. Ele também ressalta a importância de tratar esses fatores adequadamente tanto para a prevenção quanto para o tratamento de doenças degenerativas.
*ACÁCIO MORAES/Folhapress
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