Esportes

Revelações e confissões do ex-árbitro que foi o pivô da ´Máfia do Apito´

Da Redação*
Publicado em 24 de agosto de 2024 às 20:31

Foto: Reprodução/sportv

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Pivô do esquema de manipulação de resultados conhecido como Máfia do Apito, o ex-árbitro Edílson Pereira de Carvalho disse ser torcedor do Corinthians, concordou com o banimento que o tirou do futebol em 2005 e revelou ter pensado em suicídio por três vezes.

“Eu já pensei em fazer besteira. Hoje eu penso: ‘Graças a Deus que não fiz isso’. Eu sofri demais durante cinco anos”, declarou Edílson Pereira de Carvalho, em entrevista ao canal Cartoloucos no YouTube.

Edílson recebeu o Cartolouco em sua casa e contou tudo sobre a Máfia do Apito, que lhe rendeu uma prisão de cinco dias e o banimento do futebol. “Máfia de duas pessoas? Já começou errado esse título, mas tudo bem'”, disse.

O ex-árbitro opinou que os jogos anulados em 2005 não deveriam ter sido refeitos. “O Corinthians foi campeão pelos dois jogos por competência exclusivamente do Corinthians. O imbecil da história foi o Edílson Pereira de Carvalho, um merda na história. O campeonato, penso eu, deveria terminar por ali”, afirmou. “Meu pai era corintiano, minha mãe. Apitei dezenas de vezes o juvenil, juniores e profissional, e nunca influenciei.”

Edílson classificou como justo o seu banimento do futebol. “Completamente justo. Errou tem que pagar. Não tem cabimento um árbitro participar de um esquema e continuar apitando. Ele tem que ser banido, ele vai fazer isso todo jogo. Essa merda eu fiz e está valendo para a vida toda.”

O ex-árbitro recordou que ficou trancado em casa e sofreu para achar emprego. “Fiquei completamente trancado dentro de casa. E precisava continuar com o sustento da minha esposa, da minha filha. Onde tem gente eu não vou. O que eu sofri mesmo, a partir de 2008, foi na procura de empregos. ‘Me deixem em paz, por favor’. Me deixem viver. Ou é todo mundo santo? Todo torcedor e todo ser humano é santo… Só eu que errei nessa vida.”

Ele disse que ainda assiste futebol, mas parou de acompanhar o esporte depois do episódio. “Eu parei de ver futebol em 2005, quando aconteceu o fato. Ficou aquilo de torcida, qualquer erro era grito de Edílson. Eu chorando, e minha filha perguntando ‘por que estão gritando o seu nome’. Morri de vergonha disso. Algumas coisas perduram. E no meu caso, no futebol, perdura até hoje. Eu joguei tudo a troco de dinheiro.”

O que mais ele disse:
É fácil manipular uma partida. “Você consegue até antes do jogo. Você pega um jogador famoso, um cai-cai, chega e dá amarelo, na outra ele vai se jogar e você dá vermelho. E pênalti, você pode dar num escanteio. É fácil você manipular jogo dentro de campo. O árbitro manipula quando ele quiser, e principalmente um árbitro que tem nome. Aí o jogador respeita muito mais”.

Voltaria pênalti que Marcos defendeu de Marcelinho em 2000 (Palmeiras x Corinthians, pela Libertadores). “Hoje eu voltaria aquele pênalti, e não por ser corintiano. Antigamente você não tinha o hábito de voltar pênaltis [por adiantar]”.

Apitaria de olho fechado se tivesse VAR naquela época. “No meu tempo, se tivesse VAR, eu apitaria de olho fechado. Tudo que me chamou, é o VAR. Eu me jogaria atrás do VAR. Porque se eu não dou um pênalti, e o VAR me chamou, já sei que vou voltar e é pênalti. Eu não vou contra o VAR. Eu vou jogar o VAR contra todo mundo. O impedimento então, mais fácil para o assistente. ‘Vou levantar todas'”.

Arrependimento que perdura até hoje. “Eu me arrependi naquela época já. Vou perder um distintivo da Fifa, vou perder minha carreira, que faltavam três anos [para aposentar]. Poderia ser um comentarista. Pelo menos trabalharia, não sofreria”.

Pênalti de Tinga em 2005 em jogo apitado por Márcio Rezende. “Simples. Se esse jogo fosse no Beira-Rio, o Márcio teria dado pênalti. Se eu estivesse apitando, pênalti e expulsão”.

Grafite salvando rebaixamento do Corinthians no Paulistão de 2004. “Teve um jogo em 2004, o Corinthians estava para cair, contra a Portuguesa, no Pacaembu, e perdeu. E eu que estava apitando. Mas quem salvou o Corinthians depois foi quem? O Grafite, do São Paulo, no jogo em São Caetano [2 a 1 contra o Juventus, resultado que salvou o Timão]’.

Como começou o esquema da Máfia. “Em 2004 me ligou uma pessoa de Piracicaba [Nagib Fayad, o Gibão]. Primeiro era para apitar uma partida amadora, o técnico queria que fosse campeão e dariam 5 mil reais. Aí, em 2005, de tanta insistência novamente, já comecei a tendenciar uma coisa que eu não queria. Era um jogo na Argentina, entre Banfield e Alianza Lima, do Peru, primeira ou segunda rodada da Libertadores. Na minha cabeça, não vou fazer. Ele apostou, não sei quanto, e ele ia me dar R$ 10 mil. ‘Qual você escolhe, Edilson? Banfield, empate ou Alianza?’. Eu falei: ‘Não sei como está um ou outro. Vou escolher o time da casa, evidentemente’. Acabei não fazendo porra nenhuma, e o Banfield ganhou. ‘Não influenciei, estou tranquilo comigo'”.

O segundo jogo do esquema. “No outro dia, o ‘Gibão’ aparece lá com o dinheiro. Aí pensei: ‘Não vou fazer [influenciar] no próximo jogo e vou ganhar mais um dinheiro, só que vou pedir 20 mil. Guarani x Corinthians pelo Paulistão. E o Corinthians com aquele timaço, com Tévez, Mascherano… Não precisava de jeito nenhum um árbitro ajudar o Corinthians. No outro dia, ele me encontrou no aeroporto e me deu R$ 20 mil. ‘Não fiz lá na Argentina, e agora ganho R$ 20 mil sem fazer nada’. E isso foi me alucinando pelo dinheiro”.

Manipulação no Brasileirão e a descoberta do esquema. “Aí vem o Brasileirão e dizem que eu fiz os onze jogos. Não fiz os 11 jogos. Desses 11, o único que eu fiz foi Vasco da Gama x Figueirense. Psicologicamente, eu estava envolvido forte na conversa com ele, e disse que eu sairia até de camburão, mas que daria Vasco da Gama. E numa jogada interpretativa, numa falta dentro da área… Se fosse meu estilo de apitar, eu não tinha dado o pênalti. E dei. Aí o Romário foi e fez o gol. Foi só esse jogo que eu mudei alguma coisa dentro do jogo”.

Vendeu todas as camisas que trocou com jogadores. “Mais de 700 camisas. Desempregado, uma pessoa foi lá em casa… ‘Por que você não vende isso aí’? Eu vendia por 800, mil, qualquer camiseta. Fiz um site com o meu nome, vendi as camisetas que nem água”.

Se achava um grande árbitro. “Eu me achava muito bom árbitro. ‘Pediu cartão, vai tomar, e eu vou decidir se vou dar em quem bateu’. Quem manda aqui sou eu! Eles [jogadores] já chegavam querendo engolir você. Hoje, os jogadores chegam em cinco, seis… Eles reclamam da arbitragem e a arbitragem não faz nada. Hoje falta personalidade aos árbitros”.

O que mais gosta de fazer hoje. “O que eu mais gosto é, antes do trabalho, andar uns 12, 13km. Dou uma corridinha, tomo o meu vinho, uma garrafa em uns três dias”.

O QUE FOI A MÁFIA DO APITO
O esquema da Máfia do Apito foi descoberto em 2005 pelo jornalista André Rizek e publicado pela revista Veja.

Os ex-árbitros Edílson Pereira de Carvalho e Paulo José Danelon receberam dinheiro para manipular resultados, ajudando criminosos a lucrarem em apostas milionárias.

No dia seguinte à denúncia, Edílson foi preso, junto com o empresário Nagib Fayad, o “Gibão”, apontado como mentor da Máfia do Apito.

REVIRAVOLTA NO BRASILEIRÃO 2005
De acordo com as investigações, os 11 jogos apitados por Edilson no campeonato foram manipulados e, por decisão da Justiça Desportiva, acabaram sendo anulados e disputados novamente.

O Corinthians foi o campeão com três pontos de diferença para o Internacional, que era o líder antes da anulação das partidas. O Timão era o terceiro.

O Corinthians havia sido derrotado nos dois jogos anulados, ambos clássicos contra rivais: 4 a 2 contra o Santos e 3 a 2 contra o São Paulo. Nos ‘novos jogos’, o time alvinegro somou quatro pontos: 3 a 2 sobre o Santos e empate de 1 a 1 com o São Paulo.

A reviravolta revoltou a torcida colorada. Se os placares originais tivessem sido mantidos, os gaúchos teriam vencido o Brasileiro com um ponto a mais do que os paulistas.

Edílson foi banido do futebol e se tornou réu em ação penal, assim como Fayad e outros quatro participantes da máfia.

 

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