Economia

Mais de 35 milhões de operações de Pix de 1 centavo; entenda o que ocorre

Da Redação*
Publicado em 20 de março de 2024 às 16:46

uso de celular

Foto: Freepik

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“Oi, amor, você esqueceu de me bloquear no aplicativo do banco.” A frase corre como meme, mas, para Karolayne Costa, 25, tem fundo de verdade. A estudante de direito afirma ter feito Pix de R$ 0,01, entre outros valores menores, para se comunicar com o ex-namorado que a havia bloqueado nas redes sociais.

“Meus Pix de R$ 0,01 são basicamente histórias de relacionamentos frustrados, onde fui bloqueada em tudo quanto é lugar. E além de usar Pix, já usei email, mensagem no Linkedin, mensagem no PicPay”, disse Karolayne.

“É [um método de comunicação] eficiente, mas às vezes não funciona. Com meu ex-namorado, não deu em nada. Mas teve uma vez que foi o contrário: bloqueei outro menino de tudo, e ele me mandou um Pix pedindo para que eu o desbloqueasse. Aí eu respondi o Pix dele com um recado e devolvi com o mesmo valor.”

O caso de Karolayne não é isolado. De acordo com dados do BC (Banco Central), responsável pelo método de pagamento instantâneo que caiu no gosto dos brasileiros, a quantidade de transações no valor de R$ 0,01 tem subido ano a ano.

Em 2023, o total de transferências chegou a 35,3 milhões de operações –aumento de 43% em comparação com 2022.

“O brasileiro é muito criativo. O que começou como um método de pagamentos virou uma rede de comunicação. Ou seja, a ferramenta foi apropriada pelos próprios usuários para outro fim que não o de efetuar pagamentos”, diz José Mauro Nunes, professor da FGV Ebape (Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas).

Tem quem faça transferências para testes e checagens funcionais e outros, para entrar em contato com o destinatário mais facilmente.

Um caso de 2022, noticiado pelo programa Balanço Geral, da Record, chamou atenção. Uma mulher foi bloqueada pelo namorado nas redes sociais, após contar que estava grávida. Ela então forneceu as chaves Pix do companheiro para uma advogada, que descobriu que ele usava um nome falso e o localizou para pagar pensão.

Nas redes sociais, mais relatos sobre usos inusitados do Pix.

“É no mínimo criativo, até engraçado e eficiente em alguns casos, mas me gera preocupação pensando em privacidade de usuários”, diz Nunes.

As chaves usadas no sistema de pagamento são CPF/CNPJ, email, telefone e uma combinação aleatória de algarismos —a última sendo a mais segura na avaliação de especialistas, por não conter informações pessoais.

Nesta segunda-feira (18), o BC divulgou o vazamento de dados cadastrais de 46.093 chaves de clientes da Fidúcia, sociedade de crédito voltada ao microempreendedor e à empresa de pequeno porte limitada. Essa foi a sexta ocorrência de vazamento desde que o sistema foi lançado, em novembro de 2020.

“São dados sigilosos. A privacidade e a confiança nos sistemas financeiros são o que fazem a tecnologia escalar. Vide o caso do Facebook: desde o escândalo Cambridge Analytica [que revelou o uso de dados dos usuários para campanhas políticas], a rede social perdeu muito público. É quase um deserto perto do que era.”

Para situações como as de Karolayne, em que há tentativas de contato com pessoas que não querem ser contatadas, o especialista afirma que o BC deve agir para regular e neutralizar usos equivocados da ferramenta.

“Isso é especialmente importante para casos em que há possibilidade de assédio, importunação, quebra de medidas protetivas. Colocar limites de pagamento mínimo e restringir remetentes podem ser formas de proteção.”

Procurado pela reportagem, o BC não respondeu a um pedido de comentário sobre o uso do Pix para outros fins até o momento de publicação desta reportagem.

*TAMARA NASSIF/folhapress

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