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No passado, elas conquistaram fama, dinheiro e sucesso, mas, ao que tudo indica, sentiam que faltava algo em suas vidas. Para algumas atrizes, modelos, dançarinas e personalidades da mídia que revelaram seus talentos na música, no Carnaval, na televisão ou mesmo em revistas masculinas, os holofotes fazem parte de um passado remoto.
Hoje elas têm algo em comum: a religião. São famosas que deixaram a notoriedade de lado em nome da fé.
Como uma espécie de “chamado divino”, elas decidiram encerrar suas carreiras ou, em alguns casos, pausá-las, em busca de uma redenção. A conversão pode ser algo muito individual, cuja motivação varia bastante, entretanto, elas seguiram um caminho para uma realização interior que a vida artística parece não ter-lhes trazido.
O SAMBÓDROMO DEU LUGAR À IGREJA
Entre as musas do Carnaval carioca -sejam rainhas ou madrinhas de bateria, um dos postos de maior destaque nas escolas de samba-, para algumas delas atualmente a realidade é outra. Com muito mais roupa e devoção.
Há muitos anos associada à sua interpretação como a sedutora personagem Globeleza, Valeria Valenssa, 52, encantou o país na vinheta carnavalesca da Rede Globo por mais de uma década. Ela também brilhou na Sapucaí nos áureos tempos, mas hoje prefere se dedicar aos cultos em uma igreja na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio.
A conversão veio em 2005 após um período difícil. “Tive uma depressão forte, logo em seguida a Globo tinha me dispensado, estava com os meus dois filhos pequenos, e foi nesse momento que tive esse encontro verdadeiro com Deus”, relatou, por telefone, à reportagem.
Quando foi convidada por um casal de amigos pastores para assistir ao testemunho do ex-automobilista Emerson Fittipaldi, a modelo Ângela Bismarchi, 57, estava no posto de rainha de bateria do Império Serrano. Ali, concluiu que seu lugar não era no meio da festa profana. “Estava no auge quando decidi largar o Carnaval e o mundo secular”, relembra ela, que se tornou conhecida nacionalmente pelas inúmeras cirurgias plásticas —nem ela sabe ao certo a quantas se submeteu.
Bismarchi (foto) conta que começou a estudar o evangelho a partir dali e a frequentar os cultos, onde passou a ter uma nova visão sobre a vida. “Me vi em várias personagens da Bíblia, como uma mulher pecadora, que usava a sensualidade no Carnaval, nas revistas [masculinas], isso me tocou muito, não queria mais aquilo pra mim, e resolvi largar tudo”, desabafa.
Convertida há 12 anos, ela relembra os momentos difíceis que passou com a morte dos pais, da irmã, do irmão e de seu marido Ox Bismarchi (assassinado durante um assalto a residência do casal, em dezembro de 2002). Entretanto, ela explica que não foram essas perdas que ocasionaram a sua conversão, mas sim o início dos estudos bíblicos.
A fé, conta Ângela, foi seu alicerce para lidar com a morte do filho Igor Filgueiras em 2022. “A saudade é grande, mas tenho paz no coração porque Deus me conforta. Nesses momentos difíceis que passei, a minha irmã tirou a vida porque não encontrou uma saída quando estava em atribulação.”
DOS PALCOS PARA OS CULTOS
Abordar a conversão significa também relembrar o passado, algo que ainda pode ser um tabu para quem um dia já teve a imagem vinculada à sensualidade. A ex-dançarina do grupo baiano É o Tchan Débora Brasil, 53 conheceu a fama em 1995 ao lado de Carla Perez.
Com coreografias sensuais e músicas de duplo sentido, a morena e a loira do Tchan, como eram conhecidas, fizeram muito sucesso, principalmente Carla. Evangélica há 22 anos, Débora se declara também missionária e participa de cultos em igrejas em todo o país.
Coincidências do destino, Carla também aderiu à religião evangélica há 12 anos e, desde 2016, vive com a família na Flórida, nos Estados Unidos. Procurada pelo F5 para comentar o assunto, Carla não retornou o contato; a secretária de Débora informou que ela também não poderia falar. O mesmo ocorreu com a atriz Karina Bacchi, capa de uma edição da Playboy de 2006 em que, no ensaio, mostrou uma novidade para muita gente: um piercing na genitália.
Bacchi foi batizada numa igreja evangélica em meados de 2022 e já admitiu publicamente que as fotos são seu maior arrependimento em toda a vida. À reportagem, a assessoria da artista disse que ela estava ocupada em uma gravação e não poderia atender ao pedido de entrevista.
‘SOU ABENÇOADA POR DEUS, NINGUÉM ESTÁ LIVRE, TODOS NÓS SOMOS PECADORES’
Muito antes do sucesso do É o Tchan, Regininha Poltergeist, 53, enlouquecia o público masculino nos shows de Fausto Fawcett nos inferninhos de Copacabana, em 1991. “Amém, Regininha!”, bradava em coro a macharada presente aos espetáculos de dança sensual, sempre com uma pitada de sadomasoquismo.
Os convites para posar nua não tardaram a chegar. Foram cerca de 15 ensaios despida para diversas revistas. Além disso, fez cinema e TV, mas quando veio a escassez de trabalho, ela se rendeu aos filmes eróticos em 2005, revelando que não soube administrar na época o cachê, de R$ 400 mil: “Dei entrada em um apartamento na Barra da Tijuca, mas não consegui comprar, ajudei a pagar o INSS atrasado dos meus pais e me sustentei por muito tempo com meu filho”, conta.
O término do casamento foi uma das razões que a levou a buscar novos caminhos na fé, em 2008. “Estava casada, sofri várias agressões físicas e verbais, e outros problemas, precisava de uma mudança de vida no geral.” Desde então ela passou por algumas igrejas, mas admite que as dificuldades financeiras ainda persistem. Tem se virado como pode vendendo roupas e fazendo massagens terapêuticas.
Durante a conversa, realizada em uma livraria no centro do Rio, ela deixou escapar que também tem vendido conteúdo adulto (nudes) no WhatsApp como uma forma de melhorar a renda, atualmente parca. Mas ela avisa que planeja alugar em breve uma sala comercial para se dedicar integralmente ao shiatsu, como fazia no ano passado -apesar das segundas intenções de alguns clientes, muito em função de seu passado midiático, segundo ela.
Outra que também deixou a carreira de lado, foi a veterana atriz Darlene Glória. Após vários altos e baixos na vida pessoal e uma depressão profunda na década de 1970, a estrela do filme “Toda Nudez Será Castigada” (1973), converteu-se à religião evangélica ainda naquela época.
Anos depois, retomou a vida artística após um longo período morando nos Estados Unidos. De volta ao Brasil em 1997, ela fez novelas e filmes. Seu último trabalho foi no cinema, em “Beiço de Estrada”, de Eliezer Rolim, de 2018. Darlene, 82, vive reclusa há 21 anos em Teresópolis, na região serrana do Rio. Ela optou pelo silêncio ao ser procurada por telefone pela reportagem.
‘TIVE PROPOSTA PARA FAZER PORNÔ PLUS SIZE, O DIABO NÃO DESISTE’
Após um breve namoro com o ex-jogador Ronaldo Fenômeno em 1996, a paulista Viviane Brunieri, 48, agarrou todas as oportunidades que surgiram. No ano seguinte, aos 20 anos, foi capa da Playboy e, logo depois, integrou o grupo musical As Ronaldinhas, ao lado de Nadya França; a dupla era presença constante nos programas dominicais do SBT.
Passado o sucesso, vieram as polêmicas envolvendo filmes eróticos, vício em metanfetamina, álcool e prostituição. A redenção, como ela diz, veio com a conversão, em 2009, quando teve uma “visão” em um quarto de hotel após o uso de substâncias ilícitas com um empresário em Porto Alegre.
“Acordei, vi o cachê na cabeceira da cama, estava sozinha e comecei a ter alucinações, vi vários apresentadores [de TV] dizendo ‘ex-Ronaldinha é encontrada morta em motel’, esse seria o meu fim”. Após o presságio, ela voltou para São Paulo e decidiu buscar ajuda. Internou-se em uma clínica para tratar o vício.
“Ali foi a virada mesmo, foi aí que decidi me firmar nos caminhos do Senhor, porque se não, poderia até deixar uma herança para os meus filhos, mas jamais um legado”, contou, por telefone, diretamente do Japão, onde está realizando compromissos da igreja.
O caminho para a libertação foi árduo, relembra ela. Segundo Viviane, foram nove anos de “muitos obstáculos” até conseguir se converter definitivamente. “Não conseguia me firmar, ia à igreja, fazíamos célula na casa da Carla Perez, vários artistas participavam, a Mara Maravilha me ajudou muito, mas não conseguia renunciar [às drogas e à prostituição], e o evangelho é renúncia”, diz, atribuindo esses percalços ao meio em que estava inserida, um ambiente de festas e badalações.
Hoje, Brunieri se considera uma nova pessoa. Formada em teologia, ela também é missionária, e diz ter se desfeito de todos os bens conquistados em outros tempos: terreno, carro importado e dinheiro, bastante dinheiro. “Quase todos os dias tenho que dizer ‘não’, já tive proposta para fazer filme pornô plus size, então digo que o diabo não desiste e, a cada ‘não’ dito, entendo ser mais um dia que venci”, revela ela, que é sócia de uma empresa de pavimentação no Japão e mãe de dois filhos, um rapaz de 21 e uma adolescente de 17.
ARREPENDIMENTOS E VAIDADES
Para Ângela Bismarchi não existe conversão sem arrependimento. “Me arrependo de ter feito fotos nua, não tenho vontade de voltar ao Carnaval ou me expor, larguei as práticas erradas, mas não o mundo artístico”, diz ela, com doutorado em ministério e bacharelado em teologia. Conhecida pelos procedimentos estéticos feitos em série, alguns em partes mais recônditas de sua anatomia, ela também dá palestras e testemunhos em igrejas.
Ao contrário de Bismarchi, Valenssa afirmou não ter arrependimentos. “Não me arrependo de absolutamente nada, tudo que fiz foi muito planejado, e fiz porque Deus permitiu que fosse dessa forma. Acho que tenho uma história linda.”
Regininha, por sua vez, lamenta apenas um fato ocorrido na juventude. “Fiz um aborto aos 17 anos, me arrependo de ter feito isso, só de lembrar bate uma tristeza, já pedi perdão a Deus, mesmo assim é difícil esquecer”, rememora. Viviane também compartilha de sentimento semelhante, “me arrependo dos abortos que fiz, foi o início de um abismo, isso me gerou muitos traumas, e também me arrependo dos filmes [adultos], fiz por dinheiro para realizar alguns sonhos”, diz.
Ao serem questionadas se são mais felizes hoje em relação ao passado sob os holofotes, todas asseguraram que sim, e não demonstraram saudades da fama. Elas também foram quase unânimes ao responder que não deixaram a vaidade de lado pela crença, sendo possível conciliar ambos.
“Sempre me cuidei, sempre tive essa consciência desde pequena, hoje tenho esse entendimento de que meu corpo é templo do Espírito Santo e tenho que cuidar, sim”, diz Valenssa que lançará em breve um livro relacionado à beleza.
Bismarchi argumenta: “Sabia que existe a teologia do corpo? A gente prestará contas do nosso corpo a Deus, então temos que cuidar bem dele”, declarou. “Continuo me cuidando, mas não me exponho mais como antes, usei muito a sensualidade, e a Bíblia diz que isso é pecado da forma como fazia. Bloqueio muitos homens no Instagram, o assédio ainda é grande, ainda mais agora, divorciada.”
É como diz o versículo bíblico 2 Coríntios 5:17: “Portanto, se alguém está em Cristo (…) as coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!”.
*ANDRÉ ARAM/Folhapress
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