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Edjamir Sousa Silva

Edjamir Sousa Silva

Padre e psicólogo.

“Que crime ele cometeu?”

Por Edjamir Sousa Silva
Publicado em 24 de março de 2024 às 15:30

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A entrada de Jesus em Jerusalém cumpre a profecia de Zacarias a respeito do Messias: “Seu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado num jumento […]. Ele anuncia a paz a todas as nações (Zc 9, 9-10).

Os que o acompanham não trazem consigo armas, mas ramos (que lembram a Aliança). Não eram filactérios (paninhos com trechos das escrituras) espalhados pelo chão, mas seus mantos (aquilo que era próprio de seu cotidiano). O Messias chegou.

A igreja, desde cedo, introduziu essa passagem do evangelho nos seus atos litúrgicos, abrindo a Semana Santa, mas não quis se perder na simbologia e teatralidade, quis nos levar ao real: Um rei justo, pobre, que anuncia a paz.

Desde Nazaré, este rei justo e pobre vem anunciando a paz. E como a paz é fruto da justiça/amor ela causa desconfortos (cf. Isaias 32, 17. Mt 5, 9. 13. Tg 3, 18. São Tomas. Suma Teológica. Vol II. p275).

Em meio a esse caminho Jesus recebe um titulo e, talvez, um dos mais bonitos, que lhe fora dado pelos seus adversários: “Ele é amigo dos pecadores, meretrizes e publicanos” (cf. Lc 15, 1-2. Mt 9, 11).

Pelos caminhos da Galileia, andava Jesus com muitas pessoas que, religiosos e Herodianos, chamam de gentinha, de pobretões, sem classe, sem estilo, sem a estética da moda. Podemos imaginar o quanto o Filho de Deus foi feliz ao lado desses seus amigos: sorria, festejava, cantavam, dançavam, rezam juntos, falavam sobre a vida, etc (recordo aqui os episódios de The Chosen).

Em meio aos seus amigos, Jesus não era um supremacista, falava de um Deus amoroso e misericordioso, não vivia a lhes dar aulinhas de catecismo moralista (como faziam os fariseus e Mestres da Lei), mas ao contrário, os colocava como protagonistas do Reino de Deus (cf Mt 5. 21, 31).

JESUS É AMIGO DE PESSOAS QUE TEM MÁ FAMA: É UMA PERSONA NON GRATA e, ainda, se diz ser Filho de Deus, questiona a rigidez da lei, diz que destruirá o templo, que é maior que Abraão… Sua história de vida (suas escolhas e valores) vai dando matéria de tantas acusações, fofocas, julgamentos por parte de pessoas que são tidas como pessoas de bem, piedosas, honestas. Mas, a lógica do evangelho reduz todos esses esquemas ao pó da mera vaidade e hipocrisia.

Conta-nos o evangelho de João: “Pilatos foi ao encontro dos Judeus e lhes disse ‘nenhuma culpa encontro nele! (…) Eis que vo-lo trago aqui fora para saberdes que não encontro motivo algum de condenação…eu não encontro culpa nele! Pilatos procura liberta-lo’” (Jo 18, 38ss).

“Que crime ele cometeu?” A narrativa da Paixão, em João, diz: “Se o soltas, não és amigo de César…NÃO TEMOS OUTRO REI A NÃO SER CESAR!” (JO 19, 12-15) e conforme a lei, ele deve morrer, por que se fez Filho de Deus” (Jo 19, 7). Uma razão politica e uma razão religiosa.

Os evangelistas lembram que Jesus “subverte o povo ensinando por toda a Galileia” (Lc 23,5). Os ensinamentos de Jesus, que tem no centro a fraternidade: “vos sois todos irmãos” (Cf Mt 23, 8) causam desconforto: “Se deixarmos esse homem agindo assim, todos vão crer nele e os romanos virão e destruirão o templo e a nação” (Jo 11, 48-50).

Os motivos religiosos eram sempre mais acentuados com as intrigas das lideranças do Sinédrio contra Jesus que, segundo eles, viva a dizer blasfêmias: “NÓS QUEREMOS APEDREJAR-TE, não por causa de alguma boa obra, mas por blasfêmia, pois sendo homem tu te fazes Deus” (Jo 10, 33).

São Mateus, diante das discursões dentro do Sinédrio, lembra o que o Sumo Sacerdote interpelou: “És tu o Messias, Filho de Deus?”. E Jesus respondeu: “Exatamente como dizes!” (Mt 26, 63-64). E a sentença lhe foi dada: condenado por um jogo politico de subversão e, por blasfêmia. No âmago da questão está “o amigo dos pobres e pecadores” que incomoda aqueles que se julgam serem homens de bem.

Dom Luiz Gonzaga Fernandes (in memoriam), em sua pregação sobre a morte de Jesus (em 27/03/1988) disse: “Assim, através dos tempos, este mesmo Cristo em seus discípulos fiéis e em sua igreja, continuará sob as incompreensões de todos os poderes do mundo e guardiões do templo. O evangelho subverte sempre a ordem estabelecida e põe em crise as “religiões” de estado. Herodianos e Levitas se articulam contra a proposta do Nazareno, em busca de um homem novo e uma nova sociedade. Por isso, ele deve morrer!”

O Sinédrio condenou Jesus à morte por que Ele, amigos dos pecadores, representava uma blasfêmia e uma vergonha para a fé daqueles “homens de bem”. Eles não são anunciadores da fé, mas de moralidades, de legalismo, de liturgias cheias de pompas, criminalidades e sem Deus. Eles foram capazes de excluir e matar quem pregasse o “evangelho da inclusão”.

Convém perguntar aos cristãos de nosso tempo se há alguma sombra de evangelho em nossos grupos e esquemas de pastorais? Se Jesus está presente no modo como Ele foi (amigos dos pecadores) ou estamos a inventar um Cristo para adequar-se aos esquemas humanos que vive a usar a religião e a politica para condenar as pessoas?

Boa Semana Santa!

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