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Edjamir Sousa Silva

Edjamir Sousa Silva

Padre e psicólogo.

A vassalagem e a dependência dos palácios

Por Edjamir Sousa Silva
Publicado em 14 de julho de 2024 às 16:00

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A 1ª Leitura deste domingo a liturgia nos apresenta o Profeta Amós (7, 12-15) que viveu 700 anos antes de Jesus. Foi uma época de muita prosperidade econômica e bem-estar das classes favorecidas, contrastando com a miséria de uma parcela do povo.

Os comerciantes aproveitando o bem-estar econômico fazia especulações com os preços e as medidas. O aumento dos preços dos produtos essenciais tornou inviável o consumo pelas classes pobres. Eram sempre os grandes latifundiários que saiam ganhando.

Os de grande fortuna dominavam os tribunais e subornavam os juízes impedindo que fizessem justiça aos mais pobres e defendessem os menos favorecidos. Dentro desse contexto florescia a religião em esplendor ritual nunca visto. O CULTO SÓ SERVIA PARA OCULTAR AS INJUSTIÇAS DO DIA-A-DIA.

O cap. 7 de Amós inicia com três visões arrasadoras contra Israel: uma nuvem de gafanhotos que se aproxima, o mar em chamas e Deus com um prumo nas mãos para nivelar Israel.

No santuário do rei Jeroboão havia um bezerro de ouro, mas precisamente em Betel. O culto ao ouro e a prata, tão reclamado pelos profetas, descreve um sintoma social. O conceito de estabilidade politica proporcionou muitas vezes apenas a classe empresarial (grandes comerciantes), a corte e a religião submetida aos grandes. A grande população sustentou toda essa estrutura por meio da escravidão e a injustiça social, aumentando ainda mais a miséria.

Nesse contexto, a realidade devocional é crescente, porém mecânica e serviçal aos grandes: muita formalidade, excessos de ritualidade, crescente ideal de bênçãos e riquezas e a idolatria do ouro e da prata no centro do culto.

Também ficou famosa a expressão de Amós contra as mulheres dos grandes empresários de seu tempo que, vendo a crescente miséria, se preocupava apenas com o que iam beber e comer à custa da exploração. Elas eram chamadas de vacas de Basã (Am 4, 1-3).

Amós foi enviado ali para exercer sua profecia onde falou tão ousadamente que Amasias (sacerdote) foi dizer a Jeroboão que o profeta conspirava contra ele. Amasias, não suportou mais a profecia de Amós e foi denunciá-lo ao rei Jeroboão (rei de Israel).

Depois de denunciar o profeta ao rei, Amasias diz: “vidente, sai e procura refúgio em Judá, onde possas ganhar teu pão e exercer a profecia, mas em Betel não deverás insistir em profetizar, pois aqui é SANTUÁRIO REAL, UMA DEPENDÊNCIA DO PALACIO DO REI”. (7, 12-13)

Triste papel de um sacerdote que ao invés de cuidar da fidelidade de Israel à Aliança feita com Deus serve-se de fofoqueiro denunciando aquele que fazia o papel de porta voz de Deus. O sacerdote ao invés de pregar a conversão e o arrependimento persegue o homem de Deus que queria o bem do povo.

É INACEITÁVEL ouvir de qualquer cristão, mesmo que seja uma grande autoridade religiosa, que “essa coisa de defender pobres já está ultrapassada”. O sacerdote Amasias entendia que a função da religião era dar respaldo ao rei (independente de sua conduta), Amós tem consciência de que exerce a sua função por um mandato divino. QUAL A CONSCIÊNCIA QUE TEMOS DE NOSSA MISSÃO?

Quando a religião está a serviço dos poderosos ela perde a sua finalidade real e se vende aos interesses destes. No caso do sacerdote Amasias, é visível a vassalagem da relação em relação ao poderio do rei e da classe dominante. Historicamente, conhecemos um desvio de função da religião no sistema chamado de cristandade. Para expandir sua presença e seu poder na sociedade civil utilizou-se, antes de tudo, da mediação do estado.

Sempre houve na história lideranças religiosas que se submeteram ao poder das classes dominantes buscando determinados favores e traindo a Palavra de Deus. Nas estruturas de poder ainda encontramos a prevaricação com bancadas religiosas e suas teologias de domínio e da prosperidade. O autêntico evangelho de Jesus passa longe.

Engana-se quem pensar que tentar calar a voz dos profetas, viver perseguindo e denunciando os que defendem os pequenos e excluídos ou lhe ser indiferente será o bastante: “Se eles se calarem, as pedras gritarão” (Lc 19, 40). A verdadeira profecia sempre terá seu lugar denunciando as falcatruas dos governos, da classe empresarial mercenária e dos religiosos (quando estes se desviam da justiça do Reino de Deus e da autêntica religião).

Uma vez rejeitado em sua terra (Mc 6, 1-6) Jesus começa uma nova etapa na sua missão ensinando nos povoados. No evangelho desse domingo (Mc 6, 7-13) Jesus envia seus discípulos em missão (dois a dois) dando-lhes poder sobre os espíritos maus e pede que no caminhar dos discípulos não seja ostentativo (queixa da primeira leitura), pois a missão está enraizada em Jesus Cristo: tratar dos doentes, curar os leprosos, expulsar demônios e dizer que o Reino de Deus chegou.

O Reino de Deus anunciado por Jesus não é uma doutrina, nem mesmo um catecismo ou uma lei, mas o cuidado humano com os outros. Só essa Boa Nova que é absoluta, outra coisa se torna fugaz, como foi na época de Amós. LEMBRE-SE QUE PROFECIA FAZ PARTE DA MISSÃO.

Boa semana!

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