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Professor Titular aposentado do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).
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A música e os fenômenos sonoros nos sistemas elétricos parecem, à primeira vista, pertencer a mundos distintos – um regido pela sensibilidade, criatividade e habilidade artística, e o outro pelas leis da física e da matemática que regem a engenharia elétrica.
No entanto, tanto na engenharia elétrica quanto na música, há elementos em comum que podem ser mensurados e representados por meio de símbolos: ondas, frequências, modulações, ressonâncias e componentes harmônicos. Vamos seguir juntos nessa viagem?
Fisicamente, o som é uma onda mecânica longitudinal que se propaga em um meio material (ar, sólidos ou líquidos). Originado de uma fonte, durante essa propagação, a energia da onda pode sofrer interferências de ruídos indesejados, aleatórios ou persistentes, que prejudicam a qualidade da informação captada pelo receptor.
O som provoca variações de pressão no meio. Essa variação pode ser medida em pascais (Pa) ou em decibéis (dB). O instrumento utilizado para realizar essa medição, em escala logarítmica, é conhecido popularmente como decibelímetro. Essa escala é necessária porque o ouvido humano percebe os sons de forma logarítmica, e não linear.
Nos sistemas elétricos, desde as usinas conversoras (hidrelétricas, nucleares, fotovoltaicas e eólicas) até os usos industriais, comerciais e residenciais, diversos sons podem ser captados por microfones ou pelo ouvido, entre eles: ruídos eletromagnéticos nos núcleos dos transformadores, efeito corona em torno dos condutores e isoladores de alta tensão, bem como descargas elétricas em casos de ruptura abrupta da rigidez dielétrica do meio isolante.
Nesses sistemas, a qualidade da energia elétrica transmitida está diretamente relacionada aos desvios que possam ocorrer na amplitude ou na frequência das formas de onda da tensão ou da corrente elétrica.
A frequência é um conceito fundamental tanto na engenharia elétrica quanto na música, ainda que se manifeste em contextos diferentes. Por definição, em ambos os casos, a frequência é o número de oscilações ou ciclos que ocorrem em um segundo, medido em hertz (Hz).
Por exemplo, no sistema elétrico brasileiro, a frequência padrão é 60 Hz (60 ciclos por segundo), enquanto na Europa e em outros países da América do Sul, como Paraguai, Argentina, Chile e Uruguai, a frequência é 50 Hz.
Na música, a frequência determina a altura (ou tom) de um som. Quanto maior a frequência, mais agudo o som; quanto menor, mais grave. A harmonia musical depende da relação entre as frequências das notas na escala diatônica: dó, ré, mi, fá, sol, lá, si. O “diapasão” é o instrumento utilizado para afinação, tendo como padrão a frequência de 440 Hz, correspondente à nota lá.
Assim, entender a frequência em um campo pode enriquecer a compreensão no outro — seja nos sistemas eletromagnéticos de conversão, transmissão e distribuição de energia elétrica, seja na afinação de instrumentos musicais e na regência do canto coral.
Na engenharia elétrica, especificamente nos campos do eletromagnetismo, da acústica e do processamento de sinais, existem ferramentas valiosas para gravar, analisar e simular, em ambiente virtual, as “músicas” produzidas pelos fenômenos físicos, pelos seres humanos e pelos animais.
Em termos práticos, os sons podem ser captados por microfones e convertidos em sinais elétricos analógicos e, em seguida, em sinais digitais, o que permite análises detalhadas por meio do emprego de transformadas de Fourier, filtros, espectrogramas e outras técnicas empregadas no processamento digital de sinais.
Saindo do enfoque técnico e científico e enveredando pelos insondáveis caminhos da arte, segue um fato curioso que revela como sistemas elétricos também podem inspirar criações musicais.
O fato foi relatado pelo artista multimídia Jarbas Agnelli. Segundo ele, o caso se deu quando estava folheando um jornal e, ao observar uma fotografia, percebeu algo diferente. Nela havia pássaros pousados nos fios de baixa tensão. Ao observar os cinco fios (três fases, o neutro e o terra), ele percebeu a semelhança com as cinco linhas da pauta musical e notou que a posição dos pássaros se assemelhava à disposição das notas no pentagrama.
Ele recortou a imagem e utilizou um piano para compor uma música com as notas musicais associadas às posições dos pássaros nos fios. Depois, dirigiu-se à redação do jornal e procurou saber onde morava Paulo Pinto, o autor da foto, para compartilhar a experiência.
Assim, como uma reação artística em cadeia, a sensibilidade de um fotógrafo converteu uma cena do cotidiano em uma foto; a foto se transformou em uma música e, depois, em uma sinfonia (birdsonthewires.com/music/birdsmusic), criada pelas mãos do músico e compositor Agnelli, com o apoio da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica.
Dedico este texto ao confrade Roniere Leite Soares (IHCG) e ao professor Waslon Terllizzie Araújo Lopes (UFPB), por suas generosas contribuições, que serviram para aguçar meu olhar e meu ouvido técnico-artístico diante da surpreendente musicalidade presente nos invisíveis campos eletromagnéticos.
Atenção: Os artigos publicados no ParaibaOnline expressam essencialmente os pensamentos, valores e conceitos de seus autores, não representando, necessariamente, a linha editorial do portal, mas como estímulo ao exercício da pluralidade de opiniões.
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