Arimatéa Souza

Um ´prato cheio´ de denúncias

Arimatéa Souza
Publicado em 18 de janeiro de 2025 às 0:04

Arimatea Souza

Foto: ParaibaOnline

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´Histerectomia´ sem sedação

O Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público da Paraíba, formalizou nova – ruidosa e volumosa – denúncia contra o que chama de ORCRIM (organização criminosa) que controlou por alguns anos o hospital filantrópico Padre Zé, em João Pessoa.

A apuração envolve ainda, de forma conexa, o Instituto São José (ISJ – mantenedor do hospital) e a Associação Social Arquidiocesana (ASA).

O grande ´maestro´ é o padre Egídio (de Carvalho Neto), bem como dois secretários de Estado e outra 13 pessoas.

Alerta prévio

A ação do Gaeco tem 69 páginas e já avisa que “os desvios, atos de corrupção e demais crimes ínsitos (vinculado) ao referido vínculo contratual, narrados como forma de elucidar os crimes antecedentes e historiar a participação na ORCRIM, serão objeto de (outra) denúncia autônoma.

Síntese

Como forma de situar o leitor sobre o conteúdo da ação, seguem recortes do que foi apurado pelos promotores de justiça liderados por Octávio Celso Gondim Paulo Neto, coordenador do Gaeco, tendo as participações de Rafael Lima Linhares, Jamille Lemos Henriques Cavalcanti, Dennys Carneiro Rocha dos Santos, Alberto Vinicius Cartaxo da Cunha e Daniel Dal Pont Adriano.

Itinerário

“O prefalado PIC (procedimento investigatório criminal) visa elucidar a forma pela qual os recursos públicos aportavam nas entidades referidas, como ocorria sua formalização e dispêndio dos montantes repassados.

Amplitude

“É imperioso ressaltar que o aprofundamento das diligências revelou ramificações do esquema, alcançando outros núcleos empresariais fornecedores do complexo assistência (…) evidenciando a amplitude e a sofisticação da trama criminosa ora desvelada.

Um pedaço

“Esta acusação representa apenas parte de um esquema complexo e multifacetado, sendo os demais delitos perpetrados pela estrutura ora desvelada objetos outras ações penais, as quais são responsáveis por revelar a verdadeira extensão das atividades ilícitas em questão.

Tamanho ainda incerto

“As evidências coletadas demonstram que os envolvidos contribuíram significativamente para o desvio de vultosos recursos públicos e privados, em uma escala que ainda está sendo quantificada.

Projeção

“Estima-se que milhões de reais, destinados ao cuidado dos mais necessitados, tenham sido desviados para enriquecimento pessoal e manutenção de um estilo de vida luxuoso incompatível com os princípios da instituição.

´Laranja´

“A empresa (fornecedora do hospital) Mariana Inês de Lucena Mamede está registrada no nome de Mariana Inês de Lucena Mamede, que, em 2021, exercia atividade de recepcionista numa empresa, com remuneração de 01 (um) salário-mínimo.

Convênios

“No período compreendido entre 2021 e 2023, foram firmados 14 Termos de Colaboração, com vigência de até 06 meses, totalizando recursos liberados de R$ 21.124.000,00, abrangendo ações (da área social do Estado) nos municípios de João Pessoa, Guarabira, Campina Grande, Pombal e Cajazeiras.

Prato Cheio

“O projeto (programa de governo) visava a transferência de recursos públicos para aquisição de refeições destinadas a distribuição diária para moradores de rua nas cidades beneficiadas, conforme metas e especificações constantes no plano de trabalho que integrava o termo de colaboração.

Mesmo ´tronco´

“Em 92% da documentação analisada para formalização dos Termos de Colaboração, os orçamentos foram apresentados pelas empresas pertencentes Kildenn Lucena, constando apenas o preço base de cada refeição, sem detalhamentos sobre composição, quantidade ou modo de fornecimento.

Recém criadas

“Ao correlacionar as datas de constituição das empresas, verificou-se que 62% dos fornecimentos foram realizados por empresas constituídas em 03/22 e 07/22, o que indica a criação de CNPJs para servir o escopo único de participar no esquema fraudulento.

Indícios

“Notas Fiscais com numeração praticamente sequencial, indicando “cliente” único; atestados fraudulentos de recebimento de insumos e serviços; atestados de prestação de contas de fornecimento de refeições mediante relatórios descritivos sumários; ausência de evidências de atendimento a pessoas cadastradas; quantidades de refeições fantasiosas, apenas para ´confirmar´ o previsto nos Termos de Colaboração pactuados com a Secretaria de Desenvolvimento Humano.

Em profusão

“Para se ter uma ideia da importância desse núcleo para o estratagema criminoso orquestrado por (padre) Egídio, a João Ferreira de O. Neto Carnes e Frios – EPP recebeu da Ação Social Arquidiocesana (ASA) R$ 12.729.690,65 por meio de 152 transações.

´Bate e volta´

“Os valores das notas eram acordados com o responsável pela empresa e, após o pagamento já efetuado, ocorria uma ´devolução´ pré-definida de valores (denominada nas tratativas de ´devolução´) a título de propina.

´Arquiteto´

“(padre) Egídio montou uma estrutura criminosa enraizada no hospital e no Instituto. Ele centralizou o poder para se beneficiar de um sem-número de condutas perdulárias, objetivando seu enriquecimento e o aumento exponencial de seu patrimônio, que alcançou, no mínimo, 32 imóveis, carros de luxo de elevado valor, joias, acessórios caros, obras de arte, entre outros bens.

Chefe e…

“(padre) Egídio desempenhava a função de Presidente do Instituto São José, entidade mantenedora do hospital. Por ocupar cargos elevados e ter acesso privilegiado a agentes da alta cúpula do Estado da Paraíba, Egídio detinha o conhecimento dos fatos delituosos perpetrados na administração do hospital.

… Operacional

“(padre) Egídio capitaneava um esquema criminoso de desvio de recursos públicos, utilizando pagamentos a terceiros, transferências bancárias e depósitos para pessoas não vinculadas às atividades do Hospital.

Quanto e a quem

“(padre) Egídio determinava os valores que deveriam ser indicados nas notas fiscais, negociando com os fornecedores os montantes a serem devolvidos a título de propina. Além disso, ele orquestrava o pagamento da propina, envolvendo recursos públicos despendidos por meio da quitação de despesas suas pelas pessoas vinculadas a Kildenn Lucena.

Papelada

“(padre) Egídio gerenciava pessoalmente a forma como os documentos inerentes às prestações de contas deveriam ser elaborados. Ele ordenava a seus subordinados a inserção de dados e valores desproporcionais em relação ao que efetivamente foi entregue. Nesse contexto, tratava também com funcionários públicos da Secretaria de Desenvolvimento para que as contas fossem aprovadas imediata e prontamente, viabilizando a continuidade da ação criminosa.

Efeito direto

“Suas (do padre) atividades interromperam serviços de finalidade pública, causando severos danos ao erário, devido ao vilipêndio dos valores ´carimbados´ repassados por entidades públicas. Isso entregou ao acaso o futuro de milhares de pessoas carentes que dependiam do serviço para se alimentar minimamente.

Elo público

“Em decorrência de sua articulação, (o padre) enraizou a ORCRIM até os órgãos públicos, sendo que a investigação – até o presente momento – identificou agentes da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano da Paraíba envolvidos.

Assessoramento

“Amanda Duarte (da equipe do padre) controlava o manejo e a utilização dos valores recebidos. Sua atuação era sempre em prol do enriquecimento e favorecimento dos interesses do grupo criminoso. Ela era responsável, em grande parte, por receber os montantes devolvidos pelos fornecedores a título de propina e por efetuar pagamentos a outros membros da ORCRIM, sempre por determinação do (padre) Egídio.

Formalização

“Andrea Wanderley (também da equipe do sacerdote) tinha a responsabilidade de montar os procedimentos de prestação de contas dos convênios que transferiam recursos às instituições mencionadas. Ela cobria a agilidade na tramitação e aprovação dos processos, facilitando o trâmite daqueles em que os interesses dos fornecedores integrantes do núcleo de empresas estavam envolvidos.

Anuência

“Jannyne Dantas ocupava o cargo de Diretora Administrativa do Hospital Padre Zé e integrava o Conselho Deliberativo do Instituto Padre Zé. Para participar do esquema e aferir recursos ilicitamente, ela se integrou aos fazeres de Egídio e Amanda, deixando de se manifestar em casos que eram de sua competência como Diretora Administrativa.

Almoxarifado

“Adicionalmente, Jannyne orquestrava o acervo material do hospital e, mesmo assim, viabilizava atestados de recebimento de materiais (sem oposição), ciente de que estes não foram entregues pelos fornecedores, já que jamais compuseram o acervo do nosocômio e muito menos foram alocados na despensa/almoxarifado.

Sem controle

“Além disso, a ausência de controle era uma constante em todas as atividades e procedimentos desempenhados pelos membros da ORCRIM, ao menos no âmbito público ou institucional.

Domínio da situação

“Denotava-se a intenção de impedir que seus atos fossem rastreados e a aparente certeza da impunidade, dado o extenso período durante o qual (padre) Egídio e seus subordinados adotaram uma postura de verdadeiros senhores dos recursos percebidos pelo hospital, Instituto e a ASA (Ação Social Arquidiocesana).

Nítida intenção

“A organização criminosa mantida por (padre) Egídio tinha como objetivo primordial o crescimento patrimonial de seus membros. Para isso, favorecia fornecedores cujos vínculos foram fortalecidos pela confiança e lealdade a Egídio. Esses fornecedores recebiam pagamentos superiores ao valor que efetivamente entregavam, o que era possibilitado pela inserção de dados falsos nas notas fiscais, registrando montantes além do que fora realmente fornecido.

Pacto

“Havia um acordo entre os núcleos de empresas e os gestores do Hospital para que parte do valor da nota fosse ´devolvida´ em espécie, a título de propina.

“Núcleo” público

“A ORCRIM contava com um núcleo estruturado na Secretaria de Desenvolvimento Humano do Estado da Paraíba, o qual era responsável pelos convênios firmados e vinculados ao Projeto Prato Cheio.

Crimes em série

“Infelizmente, a prática de desvio e apropriação de verbas, tanto públicas quanto privadas, assim como lavagem e ocultação de patrimônio, falsidade ideológica e outros crimes, foram cometidos pela ORCRIM.

Vista…

“As prestações de contas foram aprovadas ao final da vigência de cada pactuação, mesmo existindo, nos documentos apresentados, motivos claros para que isso não ocorresse e para que a sangria dos cofres públicos fosse estancada.

… Grossa

“Iurikel Souza Marques de Aguiar (servidor das citada Secretaria de Estado), caso houvesse pelo menos uma mínima observância de suas atribuições, teria, provavelmente, interrompido a atividade criminosa de Egídio e da organização criminosa desde o início.

“Absurda inércia”

“A ausência de justificativa lícita para sua absurda inércia é alarmante. Pelo contrário, ele (Iurikel) atestou como hígida uma atividade manifestamente irregular e criminosa, posicionando-se como uma peça fundamental na ORCRIM.

Enraizamento

“A ORCRIM enraizou-se a ponto de alcançar então o Secretário de Desenvolvimento Humano da Paraíba, à época Carlos Tibério Limeira Santos Fernandes, cuja atuação era singular para o desiderato criminoso.

“Ordenador de despesas”

“Como responsável pela pasta que firmou os termos de convênios, Tibério era o efetivo ordenador de despesas e o responsável final pela análise dos procedimentos de prestação de contas referentes ao projeto Prato Cheio.

Auxiliar

“Para uma efetiva compreensão do esquema, é importante trazer à baila a pessoa de Marinho Novaes da Rocha Junior, motorista da Secretaria de Desenvolvimento Humano desde 2020 (filiado ao PSB de João Pessoa), o qual já foi assessor e secretário de gabinete de vereador na época em que Tibério Limeira exercia o mandato de vereador da capital.

Portador

“Os já referidos cadernos de anotações de Amanda Dantas, encontrados na tesouraria do hospital, apontam que Tiberio recebeu reiteradamente valores a título de propina. A então tesoureira do Hospital Padre Zé anotou repasses de dinheiro – em espécie -, os quais eram entregues a portadores da mais elevada confiança dos ora denunciados, a exemplo de Tiberio Limeira e Marinho Junior.

Remessa

“Em um diálogo registrado no dia 29/06/2022, (padre) Egídio passa as diretrizes para Amanda disponibilizar a quantia de R$ 50.000,00 para Tibério. Essa quantia foi enviada através de um portador, Marinho (motorista de Tibério).

Foto do ´pacote´

“Em outro episódio que começou no dia 18/03 e terminou no dia 19/03/2022, Egídio orienta Amanda a sacar R$ 50.000,00 e deixar guardado para entregar a Tibério. No dia seguinte Egídio ordenou que Amanda contatasse Tibério e avisasse para pegar uma encomenda sua (vinda de Egídio). Ato contínuo, Amanda encaminha uma foto mostrando como acondicionou a quantia de R$ 50.000,00.

Continuidade

“Yasnaia Pollyanna Werton Dutra, na qualidade de sucessora de Tibério Limeira na chefia da Secretaria, continuou o estratagema desenvolvido por (padre) Egídio, percebendo valores similares aos daquele sucedido.

Ajustamento de valor

“Em trecho de mensagens apreendidos do WhatsApp no aparelho de Jannyne Dantas em conversa com Egídio em 11/07/2023, os dois tratam sobre a quantia que será repassada para Pollyanna Dutra.

´Aditivo´

“O valor destinado para Pollyanna é de R$ 70.000,00, e a diferença para aquele percebido por Tiberio decorreria do aumento do número de municípios atendidos pelo Projeto Prato Cheio.

Nova portadora

“Paralelamente, em conversa simultânea, Jannyne dialoga com Lídia – que é mãe de Pollyanna e funcionária do Hospital Padre Zé, na época – chamando a mesma para ir na sala do (padre) Egídio. Aproximadamente 30 minutos depois, Lídia avisa a Jannyne que conseguiu falar com Pollyanna e ela informou que a própria Lídia poderia ´levar´ a propina, junto com o motorista dela (Pollyanna).

Prática mantida

“Nitidamente, trata-se de uma continuidade naquilo já praticado, sendo o pagamento uma constante para manutenção da situação solidificada.

O entregue e o devolvido

“Por meio de verificações (conteúdo da extração já depositada em juízo), percebe-se claramente o esquema montado por (padre) Egídio, com atuação determinante de Amanda e Jannyne, no qual o pagamento feito aos fornecedores suplanta aquilo efetivamente entregue, e a diferença era devolvida (´devoluções´) em espécie logo após o crédito em conta da empresa contratada”.

Desconhecimento

A secretária Pollyanna Dutra, através de sua assessoria, informou que ainda não teve acesso à denúncia, desconhecendo o conteúdo e os supostos fatos narrados na matéria.

“Conduta retilínea”

“Ressalta-se que a conduta da Secretária sempre foi retilínea, inexistindo qualquer mácula durante toda sua vida pública. Caso se confirme a existência de tal denúncia, será comprovada a ausência de participação da secretária em qualquer suposto ilícito”, adenda o texto divulgado pela assessoria de Pollyanna.

“Manuscritos” sem valor

Tibério Limeira, em Nota, declarou que “a denúncia contra mim apresentada está montada em supostos documentos que não guardam a menor confiança, visto que não passam de manuscritos sem qualquer validade legal, podendo ter sido produzidos por qualquer pessoa e em qualquer tempo, com objetivos de imputar a alguém um ilícito”.

Sem acesso ao MP

“Durante todo o processo, coloquei-me à disposição do Ministério Público, inclusive formalizando pedido para colaborar com o esclarecimento dos fatos, mas, lamentavelmente, nunca fui chamado”, acrescentou.

Sem “suporte probatório”

Luciano Santoro, advogado do padre Egídio, também alegou não teve acesso à denúncia, mas presumiu ser uma acusação “desprovida do mínimo de suporte probatório”.

“É absolutamente leviano que o Ministério Público peça sigilo dos autos, impedindo o conhecimento dos fatos alegados por Egídio de Carvalho e outros acusados, ao tempo que o oferecimento da denúncia é amplamente divulgado na mídia”, acrescentou o advogado.

 

João, ´afasta de te esses cálices´…

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