Perda total
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Marcas do que se foi
Campina Grande é singular, na beleza e nas retorcidas históricas que o substantivo comporta.
Ainda na segunda metade do século passado, foi criado na cidade um evento original, ecumênico e demarcador de um novo tempo, assim como o estilo predominante em nossa gente: a convivência plural.
Falo do Encontro Para a Nova Consciência, que com o passar dos anos teve o seu pioneirismo convertido, lamentavelmente, em estagnação e declive.
Outro marco
Nessa caminhada pela transformação da cidade numa alternativa ao rebuliço próprio do carnaval convencional, a comunidade evangélica formulou posteriormente um encontro que cumulativamente tem se consolidado e se ampliado. Falo da Consciência Cristã.
Lado a lado
Por muitos e muitos anos, ´Nova Consciência´ e ´Consciência Cristã´ compartilharam áreas praticamente comuns e contíguas: Parque do Povo/Teatro Municipal Severino Cabral.
Coexistência
Até onde a memória alcança, não se tem registro de episódios marcantes e negativos por conta dessa ´coabitação´.
Resistência
Noutra parte da cidade, o chamado ´Carnaval Tradição´ – troças, escolas e blocos carnavalescos – manteve a sua modalidade de viver a folia, resistindo a toda sorte de dificuldades e de desestímulos público e privado.
Enquadramento
Dando um salto cronológico, eis que surge o Decreto nº 4.813/2024, assinado recentemente pelo prefeito Bruno Cunha Lima com a intenção de demarcar tempo e espaço para os festejos momescos, que sabidamente só retêm quem é atraído para programações notoriamente segmentadas ou quem tem como alternativa única a diversão do carnaval tradicional remanescente.
Espelhado
Na justificativa oficial, o aludido Decreto é a transposição de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado na última semana com o Ministério Público e na presença das forças de segurança.
Premissa
Como preâmbulo, é oportuno sublinhar que o Poder Público Municipal não é obrigado a assinar um TAC.
Demandas
Em Nota divulgada ontem, a PMCG argumentou que o Decreto “atende a recomendações expressas do Ministério Público da Paraíba e dos órgãos de segurança do Estado”.
Sem registro
É oportuno salientar que não houve (até aqui), de forma explicita, qualquer declaração pública das forças de segurança alegando que não dispõem de estrutura e condições para assegurar a ordem durante o período carnavalesco na cidade.
O detalhe
As autoridades de segurança que tomaram parte na reunião no MPPB assinam como ´testemunhas´ do referido TAC.
Dia seguinte
O TAC é datado do dia 11 último e faz menção ao Decreto que tem a data do dia 12 de janeiro último.
Contestação
Uma ação civil pública foi protocolada ontem pela Defensoria Pública do Estado com a proclamada intenção de “resguardar a forma laica do Estado e o exercício da liberdade religiosa de vários grupos diversos, em área geográfica considerável do Município”.
“Esdrúxula”
“A proibição, com as devidas vênias, é esdrúxula e gera confusões, ainda que se invoque um TAC realizado com o Ministério Público, tudo na tentativa de conferir alguma legitimidade ao decreto”, enfatiza a Defensoria.
Privações
Adiante, a ação acentua que “o município, pelo decreto, embaraça o exercício dos direitos fundamentais à liberdade de crença e à reunião pacífica, privilegiando determinados grupos religiosos teoricamente majoritários, ao passo em que, por outro lado, priva direitos (direito de reunião, por exemplo) de outras pessoas e grupos em razão de crença religiosa, privando igualmente festejos carnavalescos em logradouros públicos”.
Eivado
Por fim, a ação da Defensoria pontifica que “o ato (decreto) é eivado de inconstitucionalidade, pois viola vários direitos fundamentais de grupos, religiosos ou não, que não estejam inseridos no contexto do denominado ´Carnaval da Paz´.
“Segregadoras”
A ação requer a suspensão do aludido Decreto, uma vez que “são proibições claramente genéricas e inconstitucionais, desproporcionais e desarrazoadas, segregadoras de vários outros grupos religiosos – ou não – que não se insiram no subjetivo contexto do ´Carnaval da Paz´, bem como para que se permita a realização de festejos carnavalescos em logradouros públicos”.
Salta à vista
Não sou (sabidamente) advogado, mas o referido Decreto é insustentável, inoportuno e descabido.
O histórico das edições anteriores dos ´multifacetados´ eventos que ocorrem em Campina no carnaval indica a total desnecessidade da decisão governamental.
Síntese
Na verdade, trata-se uma intromissão surpreendente, impopular e invasiva.
Transparência
Se (eventualmente) o aparato policial não tem condições de excepcionalmente garantir a segurança da população local durante o carnaval, na habitualmente esvaziada Campina, que informe isto publicamente.
Indébita
Não seria papel da prefeitura aferir, assumir ou resguardar as possíveis limitações do aparato policial.
Intransferível
Se alguma das manifestações religiosas se sente constrangida, insegura ou conflitada pela existência de outras opções de vivenciar o esticado feriado, que também assuma publicamente suas preocupações ou ressalvas.
A reboque
O que não comporta é o Poder Público Municipal assumir uma postura de (aparente) completa resignação à ótica nem sempre precisa e holística de integrantes do Ministério Público.
Notório
Flagrantemente, o citado TAC, alinhavado por alguns operadores do direito, no que está disposto na frieza de seu conteúdo, é um inequívoco atentado às liberdades individuais e de ilegalidade evidente.
Simples assim
O melhor caminho para reparar um equívoco é a admissão do erro e imediata revogação.
Até porque, há séculos o filósofo romano Sêneca ensina que “a primeira vítima da falta de temperança é a própria liberdade”.
Erro em ano eleitoral é ´duplamente tarifado´…
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