Um diagnóstico; uma ferida aberta
Foto: Leonardo Silva/ ParaibaOnline
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Crônica
A questão da saúde pública em Campina Grande é um problema de décadas, cuja solução definitiva não está no horizonte, até porque carece de decisões políticas e medidas administrativas que dependem de outras esferas de governo.
Alavancagem
No passado, a conversão da cidade num polo médico-hospitalar para o setor público teve uma importância decisiva para o impulsionamento desse segmento, como reflexos consequentes na economia local, notadamente no item prestação de serviços e contratação de mão-de-obra.
Sem mapeamento
Acontece que o credenciamento de Campina por parte de dezenas de cidades interioranas ocorreu cumulativamente, sem que se tenha um preciso controle entre os serviços contratados, os recursos transferidos e o efetivo monitoramento e registro dos pacientes cotidianamente enviados para o atendimento contratado.
Incessante
O setor de maternidade é emblemático nesse aspecto. O Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (ISEA) passou a ser um estabelecimento hospitalar de superlotação permanente, com base no binômio maior ´comodidade´ e menos custo.
Tradução prática
Dito de outro jeito: a melhor alternativa para as pequenas cidades não é instalar uma maternidade ou uma eficaz estrutura obstétrica, mas sim colocar parturientes numa ambulância rumo a Campina Grande.
Sem limitador
Se conveniou ´X´ pacientes, mas enviou para Campina (ou para João Pessoa) ´X + 2´ pacientes para esses atendimentos, problema das ´cidades polo´.
´Remédio´ antigo
A solução operacional para esse ´diagnóstico´ é acessível e já colocado em prática por planos de saúde desde a década de 80 do século passado: o cartão de atendimento (no caso, o cartão SUS), que habilita para o recebimento quem efetivamente presta o atendimento e tem resolutividade.
O que falta?
Não existe a tal da ´vontade política´ ou decisão governamental para que o cartão do SUS seja respeitado.
As chamadas ´cidades polo´ aceitam sem muita resistência essa realidade por razões múltiplas: primeiro, porque, na prática, esses municípios referenciados propiciam a movimentação permanente de milionárias quantias em dinheiro.
´Olho no umbigo´
Segundo, porque – com frequência – os seus prefeitos têm aspirações e/ou sonhos políticos em escalada estadual e não querem se indispor com governantes e/ou governados dessas pequenas comunidades.
Nas duas pontas
O produto final é um atendimento quase ´em linhas de produção´, para não dizer desumano. E muitas vezes fatal, quando a demanda é acentuadamente potencializada, enquanto nas pequenas cidades a saúde pública é um tema que – grosso modo – passa ao largo dos debates e das demandas predominantes.
Agravantes
Nessa ´encruzilhada´ da saúde pública surgiram dois novos componentes preocupantes e que estão a merecer debate e transparência, pelo impacto e gravidade que ambos aparentemente conduzem – pelo menos para quem acompanha os fatos longe das ´enfermarias´.
Retrocesso
O primeiro deles é a investida do governo estadual para adoção de uma ´dupla regulação´ em Campina Grande, indo de encontro (conceitualmente) a um dos preceitos do SUS (Sistema Único de Saúde), que é a gestão tripartite e descentralizada da saúde pública, englobando todas esferas – municipal, estadual e federal.
Motivação
A alegação para esse paralelismo é que o município de Campina Grande tem deixado a desejar na condução cotidiana do SUS, o que provoca falhas num setor onde negligência e/ou inoperância podem ser sinônimo de mortes.
Zona de sombra
O permanente ´cabo-de-guerra´ de natureza político-eleitoral entre os mais recentes gestores do Estado e da PMCG torna opaca uma avaliação mais precisa dessa situação, até porque se Estado e município trabalhassem harmoniosamente – pelo menos as suas áreas técnicas -, sequer seria preciso cogitar a ´dupla´ ou ´paralela´ gestão.
´Injeção na veia´
Mais recentemente, o governo do Estado firmou convênios da ordem de R$ 17 milhões com dois hospitais de Campina, já com sinalização de aditivos contratuais.
Evidentemente, tudo o que for aportado nessa área genuinamente carente de recursos é importante e merece aplauso.
Seletividade
Todavia, na prática o Estado optou por atuar seletivamente, escolhendo em quais especialidades lhe interessa ou lhe convém atuar na saúde pública baseada em Campina, se permitindo – para tanto – pagar pelos procedimentos preços diferenciadamente elevados em comparação ao SUS.
Na largada do ano
Segundo componente que merece enfoque. No limiar do ano de 2024, o cenário eleitoral campinense apresentava um prefeito (Bruno) disposto a disputar a reeleição, mas com uma imagem popular ofuscada, carecendo de fatos e de ações administrativas que devolvessem a sua competitividade eleitoral.
Complicador
Além do mais, o prefeito tinha a ´sombra´ de seu antecessor, Romero Rodrigues, que sinuosamente emitia sinais de que desejava retornar ao comando da PMCG.
No âmbito da saúde, começava a funcionar um monumental hospital (Help), que apesar de ser predominantemente filantrópico, aos olhos da maioria da população não era assimilado dessa maneira.
Passos iniciais
O citado hospital carecia de um item indispensável ao seu funcionamento: pacientes.
E o atendimento crescente e volumoso era a ´correia de transmissão´ para algo fundamental a um hospital de seu perfil: série histórica de procedimentos visando a habilitação e o credenciamento de serviços e de especialidades junto ao SUS.
´Casamento perfeito´
Um ´imã´ entre a adversidade eleitoral conjuntural e a carência de histórico hospitalar foi reciprocamente tentadora – e consumada.
Faturas
Eleição realizada, prefeito reeleito e o segundo mandato iniciado.
Em meados deste ano, ciclicamente vieram à tona cobranças públicas e milionárias por parte da Fundação Pedro Américo, que é provedora do Help, na pessoa do seu diretor Dalton Gadelha.
´Curativos´
Pelo fato de ambos (prefeito e dirigente hospitalar) militarem na mesma faixa política, intermediários buscaram meios de tentar equacionar a confrontação que parecia tomar contornos de ´metástase´ no âmbito das relações administrativas e pessoais, adicionada ao encadeamento de ações e representações no Judiciário e no Ministério Público.
Derivações
O grau de exacerbação foi tamanho que os ´bombeiros´ parecem ter ficado pelo caminho, até porque se bifurcaram os interesses de natureza político-eleitoral, por conta da aproximação do Estado da gestão do Help – com o convênio acima já referido -, e das tratativas para que Dalton (Podemos) seja um dos suplentes do governador João Azevedo (PSB) na disputa por uma vaga para o Senado.
Voz e gesto
Mas houve algo mais virulento, de iniciativa discutível: Dalton utilizou a sua estrutura de comunicação para propagar que o prefeito de Campina Grande afanou – na invocação ao festejado dicionário Michaelis, roubou – recursos que pertenceriam à Fundação que preside, inclusive fazendo gestualmente a conjugação do verbo.
Efeito
Trata-se de uma denúncia da maior gravidade – apropriação indébita do gestor/administração municipal -, pelo fato de impingir a uma das maiores autoridades do Estado uma qualificação incompatível com o exercício da função pública exercida, como também por impelir uma mácula de ordem pessoal grave, que pode até mesmo impactar em futuros embates eleitorais.
Trajetória linear
A acusação recai sobre uma administração pública que está no exercício do segundo mandato, e que até então não havia sido maculada por qualquer denúncia consistente nesse terreno.
Contraponto
É imprescindível que a gestão campinense se posicione sobre as inferências disseminadas, sob pena de ganhar contornos de verdade o que é, por enquanto, uma versão unilateral de desacertos administrativos.
Em casos como esse, o silêncio é desaconselhável, até porque o evangelista Lucas ensina que diante de determinadas omissões “as pedras falarão”.
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